Paulo Dias lembra a infância do filho nadador: “A gente sabia que o mundo não ia poupá-lo de nada. O preconceito existia, existe e ainda vai existir, infelizmente”
Daniel Dias é nadador. Mas poderia ser jogador de futebol, de vôlei, ou exercer qualquer outra função que tivesse vontade. Criado com liberdade, o filho único de Paulo e Rosana foi sempre encorajado a praticar esportes e a fazer todas as atividades que seus coleguinhas faziam. A má formação congênita dos membros superiores e da perna direita nunca foi uma limitação para o agitado e sorridente menino de Camanducaia (MG) que, anos mais tarde, se tornaria o maior atleta paralímpico da história do Brasil.
– Nós aprendemos muito com o Daniel, e ele aprendeu muito com a gente. Nós nunca colocamos limites para ele. A gente sabia que o mundo não ia poupá-lo de nada. O preconceito existia, existe e ainda vai existir, infelizmente. Então, a gente procurou prepará-lo para que ele pudesse enfrentar o mundo de uma maneira diferente. Mas ele sempre foi uma pessoa determinada, aceitou muito bem a situação dele e mostrou para todos que, independentemente das limitações físicas, conseguia fazer tudo o que os coleguinhas faziam – contou o pai.
A notícia de que o primeiro – e único – filho havia na nascido com má formação, no início, assustou os pais. Paulo e Rosana eram jovens e não sabiam muito bem, naquela época, o que enfrentariam criando um menino com deficiência. Foi o dia a dia que ensinou à família a melhor maneira de lidar com este fator novo. A única certeza é de que Daniel, hoje com 28 anos, seria criado como qualquer criança.
A infância em Camanducaia, cidade do interior de Minas Gerais, foi de brincadeiras na rua e de muito esporte. Na escola, Daniel sempre queria praticar todos as modalidades. O menino nunca enxergou sua deficiência como um empecilho para fazer o que os seus colegas faziam. Muito ativo, acabava “maltratando” suas próteses por isso. Os pais recebiam diversas ligações da diretora da escola com a notícia de que Daniel havia “quebrado a perna”.
– Ele era um menino muito extrovertido, queria fazer de tudo. Sempre foi um garoto que gostou de esporte. Todo dia na escola ele brincava muito, e a diretora ligava e dizia que ele tinha quebrado a perna, mas, na verdade, era a prótese. No dia seguinte, a gente tinha que ir de Camanducaia para São Paulo, arrumava a prótese e, quando voltava, a mãe dele dizia: “Não vai joga futebol amanhã de novo”. Mas ele ia de novo, e depois tinha mais uma ligação da diretora dizendo que ele tinha quebrado a perna outra vez. Sempre foi assim. E jogava de tudo: basquete, futebol, vôlei.. – revelou o pai, orgulhoso.
Os pais, no entanto, nem sempre conseguiram poupar o filho da visão excludente de algumas pessoas. Daniel sofreu preconceito. Foi chamado de saci e de aleijado. Mas nunca deixou que isso o atrapalhasse. Quando viu pela televisão o nadador Clodoaldo Silva brilhando nos Jogos Paralímpicos de Atenas 2004, despertou o interesse para o esporte paralímpico e correu atrás. Quatro anos mais tarde era ele quem surpreendia o mundo nos Jogos de Pequim. Hoje, acumula 21 medalhas paralímpicas, número recorde entre atletas brasileiros.
– Há 28 anos não existia inclusão, o deficiente era visto de uma forma muito diferente do que hoje, apesar de ainda existir muito preconceito. Então, a gente ficava pensando que precisava construir alguma coisa para poder ele ter algum futuro. A gente não sabia como as coisas iriam acontecer. Foi uma surpresa muito agradável para nós (ele ter virado um grande nadador). Só Deus para explicar tudo isso que aconteceu na vida dele, ele ter tido o dom para a natação.
Agora a família Dias curte a emoção de ver Daniel conquistando medalhas em uma Paralimpíada dentro de casa. Em todas as seis provas disputadas pelo nadador até agora na Rio 2016, contou com uma enorme torcida organizada formada pelos pais, a esposa Raquel, os filhos Asaph e Danielzinho e muitos amigos. Nesta sexta-feira, a turma estará reunida mais uma vez, junto com outros milhares de torcedores brasileiros, para incentivar o maior atleta paralímpico do país.
– A gente se sente extremamente feliz por causa desse carinho da torcida. Esse calor da torcida contagia a gente também. É um orgulho muito grande ver o nosso filho nadando e conquistando bons resultados para o Brasil. Não tem palavras para explicar a emoção que a gente sente. Estar em casa, com a torcida vibrando, gritando o nome dele, o carinho que os torcedores demonstram… não tenho palavras para explicar isso – resumiu Paulo.
Fonte: Ativo, Daniel vivia quebrando próteses: “Nunca colocamos limites”, conta pai